
Extrato da «Apresentaçom do tradutor» de 'Recordes dos Seres Vivos', de K. Richarz e B. P. Kremer (Laiovento, outubro de 2018)
Carlos Garrido
Com a presente versom galega da obra Organismische Rekorde, de Klaus Richarz e Bruno P. Kremer, o tradutor [Carlos Garrido] salda umha dívida que contraíra desde que começou a dedicar-se à traduçom de textos científicos, tanto na qualidade de investigador e docente, como na de praticante. Com efeito, tendo este tradutor vertido para galego-português já dous livros didáticos do campo da Biologia e dous artigos de divulgaçom científica, na sua atividade tradutiva ainda permanecia sem atender um importante género textual da socializaçom do conhecimento científico —o livro de divulgaçom—, que, com estes Recordes dos Seres Vivos, fica agora bem servido. Nom será preciso espraiar-se neste lugar sobre a fundamental significaçom que, para umha comunidade sociocultural como a galega, e para umha língua (socialmente menorizada) como o galego-português da Galiza, detém hoje a redaçom, traduçom e publicaçom de livros de divulgaçom técnico-científica. Tenha-se, em conta, além disso, que, se já os livros de divulgaçom científica originalmente compostos em galego som ainda muito raros, o número de livros divulgadores do campo técnico-científico traduzidos em galego continua a ser verdadeiramente ridículo (e, provavelmente, nom superior à meia dúzia), o que patenteia o escasso avanço sociolingüístico (real) experimentado polo galego nos últimos tempos e o tacanho compromisso do poder político com a (sincera) promoçom da língua autóctone da Galiza.
Daí, por conseguinte, a grande releváncia sociolingüística que umha traduçom como esta poderia apresentar, traduçom que, se nom estivéssemos já desiludidos (desesperançados ainda nom estamos!) pola dura realidade das atitudes e dos factos, tamém poderíamos dizer que modestamente vem preencher umha lacuna e que, sobretodo, aspira a servir de modelo e estímulo para ulteriores empreendimentos nesta área. De resto, a presente obra Recordes dos Seres Vivos envolve, para qualquer comunidade sociocultural, um considerável interesse intrínseco polo seu escopo, que consiste em refletir, de forma amena e atraente, na linha do chamado infotenimento (= informaçom [rigorosa] + entretenimento [formativo]), e reparando num conjunto de valores extremos («recordes») dos organismos, dous princípios basilares do fenómeno vital: em primeiro lugar, como os seres vivos, graças à variaçom intraespecífica e à subseqüente seleçom natural, apresentam umha assombrosa capacidade de adaptaçom ao meio, e, em segundo lugar, como, na esteira da interaçom entre adaptaçom (divergente) e contingência —o acaso e a necessidade—, surge no mundo vivo umha estonteante multiplicidade, umha exuberante e fascinante biodiversidade. Estes dous princípios, é claro, constituem o cerne do processo natural designado por evoluçom, o qual, como lapidarmente formulou Theodosius Dobzhansky, a todo dá sentido em Biologia.
Antes de findarmos estas linhas, será conveniente declarar que o modelo de língua que inspira a nossa traduçom corresponde a um galego «nom secessionista», portanto nom subordinado ao castelhano e naturalmente coordenado, de um ponto de vista ortográfico, morfossintático e lexical, com as suas variedades geográficas lusitano e brasileiro, no seio das quais a língua se manifesta com vigor no ensino e divulgaçom da ciência. Por conseguinte, polo que di respeito aos usos léxico-semánticos, tomamos aqui como referência a língua culta e especializada utilizada no ámbito luso-brasileiro, peneirada e complementada por contributos codificadores da Galiza como O Modelo Lexical Galego, da Comissom Lingüística da aeg/agal (2012), e o Manual de Galego Científico, de Garrido e Riera (2011). Nesse sentido, ensaiamos na presente traduçom o expediente de assinalarmos em nota de rodapé todos aqueles casos significativos em que umha palavra surgida na nossa versom galega nom coincide com a respetiva soluçom utilizada habitualmente em Portugal (e, secundariamente, no Brasil). Com esta estratégia pretendemos, por um lado, facilitar a receçom textual a um público português (e lusófono extragalego, em geral) e, por outro, patentearmos ao público leitor da Galiza como um galego genuíno, plenamente regenerado, se encontra extremamente próximo do lusitano e do brasileiro, e como com estes aquele pode e deve interagir num «diálogo» solidário, igualitário e enriquecedor. No entanto, é claro que nom podemos perder o contacto com a triste realidade cultural da Galiza atual (largamente desgaleguizada, castelhanizada), e nom se nos oculta que, por culpa do muito deficiente corpus e do assaz insuficiente status que o poder político tem reservado ao galego, muitos dos potenciais leitores deste livro nele estranharám palavras e locuçons legitimamente galegas, e que, para as assimilarem, eles precisarám de realizar um pequeno esforço, que, em qualquer caso, sempre se revelará gratificante.
Satisfeitos, em conseqüência, por podermos dar aqui um pequeno contributo para a promoçom do galego e para o enriquecimento cultural dos galegos, e tamém por podermos levar novamente à prática aquilo que já expugemos na monografia A Traduçom do Ensino e Divulgaçom da Ciência (2016), resta-nos agradecer o bom acolhimento dispensado a este projeto pola editora Laiovento e polos seu responsáveis, Sres. Afonso Ribas e Pepe Carreiro, bem como desejar ao público umha amena e instrutiva leitura.
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